Quem diria.
Eis que me sento no banco do brt, aquele ônibus enorme, sanfonado e gelado como um coração russo. Respiro fundo, já com um sorriso confortado. Por mais que avistasse algumas feições tortas, me observando de canto, o ambiente iluminado me deixara segura, agora longe dos perigos daquela rua empoeirada pelas obras. Eu não vivo com medo por aqui. Depois de um tempo frequentando a Linha Amarela e sua mini-guerra-civil, a Barra parece um lugar bem reconfortante. Mas logo hoje eu preciso ir à rodoviária. De ônibus. Com uma mala enorme. E, pasmem, estou "bem-vestida". É claro, surge meu amigo já na porta me relembrando os últimos três esfaqueamentos ocorridos esse mês, dois perto de casa e um hoje mesmo, na lagoa. "Você com essa mala enorme e de saia? Vai morrer." Amigos são os melhores. Se me roubassem hoje, todos pensamos, quanto teria de prejuízo? Acho que vou esconder o celular na roupa e... ah, estou sem bolso. Que hora pra vestir uma saia, Mônica, quantos anos você tem mesmo? A responsabilidade só aumenta quando se está com uma mala emprestada. Malas são caras, Mônica, por que não colocou um tênis surrado? Qualquer coisa era só correr. Ou a sua menor estava boa também, dois sapatos a menos e caberia tudo nela. Agora já foi. Quando abro os olhos, logo após o suspiro de 0,7 segundo, onde ela está?! A malona simplesmente foi embora. Mas como. Sinto um vazio no peito. Olho para traz, já contabilizando o prejuízo (porque nessas horas de desespero o raciocínio funciona rápido como um estalo), e vejo um rapaz lá no fundo, moreno, boné para traz, brinco na orelha a bermuda e um sorriso. Estava com ele. "Mas o que...?" Ele estava trazendo-a para mim. A mala emprestada tem 4 rodas, no acelerar do ônibus ela se foi, suavemente, embora, sem soltar um pio. "Ah, muito obrigada!". Deixei escapar um risinho de quem fez arte e ele respondeu com uma risada divertida. "Imagina...".
É curioso como nos momentos em que mais nos preocupamos e nos sentimos atentos, a fração do tempo se revela tão significativa. Isso tudo aconteceu em menos de 5 segundos, e poderia ter arruinado uma viagem de 4 dias. Graças a Deus e à moral daquele garoto, estava tudo bem. A tensão passou, já estava sorrindo novamente. Olhei para traz uma última vez, ele também sorria amigavelmente. Sorte a minha ter sempre esses estranhos amigos pelas ruas quando decido viajar. Pra variar, carregando minhas malas.
Sorte... ou proteção mesmo. :)
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